segunda-feira, 21 de maio de 2012

Falsos Profetas (parte 5)


Por Edson Moura
A ambivalência do homem tem trazido benefícios e malefícios. Creio eu que mais coisas boas aconteceram desde que o homem começou a polarizar suas ideias. Mas quando o assunto é religião a coisa muda e figura. Quando falo que sou cético, logo sou levado ao extremo oposto da fé, sendo considerado como uma pessoa de má índole, filho do demônio e outros adjetivos que os crédulos gostam de inventar para estereotipar um ateu. Relativizar a Bíblia constitui-se um erro moral, enquanto alguns fundamentalistas a literalizam sem a menor parcimônia. Não entendem que, se levarem ao “pé da letra” ou não fazerem um exame cético acerca de algumas passagens, podem estar abrindo precedentes para justificar atos tão maus que transformariam os megalomaníacos e genocidas de nosso tempo em apenas mais um idealista com sua “causa justa”. Um exemplo evidente é o caso da historia de Josué logo após o Êxodo.

Que área do comportamento humano é mais ambíguo moralmente? Até as instituições populares que se propõem nos aconselhar sobre comportamento e ética parecem infestadas de contradições. Consideremos os aforismos: “A pressa é inimiga da perfeição”, mas posso contrapor este argumento com o seguinte: “O boi chega primeiro bebe água limpa". Ou, “É melhor prevenir do que remediar”, contrastando com, “Quem não arrisca não petisca”. Ou esta então: “Duas cabeças pensam melhor do que uma” sendo afrontada com “panela que muitos mexem ou sai cru ou queimada ou insossa ou salgada”.
Houve uma época em que a gente planejava ou justificava suas ações apoiando-se nesses tópicos contraditórios. Que responsabilidade moral têm os autores de provérbios? Ou o astrólogo que se apoia nos signos do sol, o leitor de cartas do tarot, o jogador de búzios, ou profeta da igreja da Benção?
A Bíblia nos ensina as seguintes lições: Miqueias nos exorta a trabalhar com justiça e amar a piedade (e a definição clara e resumida daquilo que Deus exige do seu povo: "O que ele quer é que façamos o que é direito, que amemos uns aos outros com dedicação e que vivamos em humilde obediência ao nosso Deus" Miqueias 6.8). No Êxodo nos proíbe cometer homicídios. Em Levítico nos ordena amar a nossos vizinhos como a nós mesmos. E nos Evangelhos nos urge a amar a nossos inimigos. Pensemos entretanto nos rios de sangue vertido por ferventes seguidores dos livros em que se acham essas exortações bem intencionadas.

No livro de Josué e na segunda parte do livro de Números se celebra o assassinato maciço de homens, mulheres e meninos, até de animais domésticos, em uma cidade atrás de outra por toda a terra do Canaã. Jericó é eliminado em uma “guerra Santa”. A única justificação que se oferece para este assassinato em massa é a declaração dos assassinos (hebreus) de que, em troca de circuncidar a seus filhos e adotar uma série de rituais particulares, prometeu-se a seu antepassados muito tempo atrás que aquela terra seria deles. Não encontramos na Bíblia “sagrada”nenhum indício de arrependimento, nem um murmúrio de inquietação patriarcal ou divina ante essas campanhas de extermínio engendradas por Josué a mando de Deus. Muito pelo contrário, Josué “consagrou a todos os seres viventes ao anátema, como Jeová, o Deus do Israel, tinha-lhe ordenado” (Josué, 10, 40). E esses acontecimentos não são incidentais a não ser centrais na narração principal do Antigo Testamento. 
Há histórias similares de assassinato em massa (e no caso dos Amalequitas, genocídio) nos livros que contam a história de Saul , Ester e outras partes da Bíblia, sem sequer uma fagulha de dúvida moral. Tudo isso, certamente, foi perturbador para os teólogos liberais de uma época mais tardia, mas duvido que para os fundamentalista tenha sido.
Diz-se com razão que o diabo pode “citar as Escrituras para seu propósito”. A Bíblia está tão cheia de histórias de propósito moral contraditório que cada geração pode encontrar justificativa para quase todas as ações que propõe. Desde incesto, a escravidão e o assassinato em massa até o amor mais refinado, a valentia e o auto-sacrifício. E este transtorno moral múltiplo de personalidade não está limitado ao judaísmo e ao cristianismo. Pode-se encontrar dentro do Islã, na tradição hindu, certamente em quase todas as religiões do mundo. Assim, não são os cientistas os que são moralmente ambíguo, mas sim, todos nós seres humanos.
A Ciência tem uma obrigação de alertar o público dos perigos possíveis, sobretudo dos perigos que emanam da própria Ciência, ou que podem se agravar pela aplicação da Ciência. Talvez esta seja uma missão profética. As advertência devem ser justificadas e divulgadas, mas seu valor não pode ser maior do que o momento exige. Se estamos sujeitos ao erro, ao engano, que erremos pensando na segurança de todos.
Uma vez que nossa vida é tão efêmera, e tão única, parece crueldade de minha parte privar qualquer pessoa que seja do consolo da fé, pois em algumas áreas, a Ciência não pode jamais remediar a angústia deixada pela decepção do homem que teve os olhos abertos para a realidade. Aqueles que não podem suportar o peso do exame cético e constatação da falácia, tem a liberdade para ignorar os princípios usados por um cético para tentar provar sua” crença”. Fé é algo que se perde aos pedacinhos, e quando vemos estamos nus, desamparados e mais cegos do que antes. É neste momento que a razão entra no jogo, que a Ciência acende uma vela e ilumina o caminho que ainda teremos que percorrer.
Acredito piamente que a Ciência está no homem a mais tempo do que a religião. O homem só chegou até aqui porque usou a Ciência na caça, na pesca, no plantio, na confecção de armas e roupas. O que não entendo é como ele pode se esquecer disto. Em determinado momento nós paramos de acreditar na Ciência para dar ouvidos a falsos profetas, e com o passar dos milênios, como não poderia deixar de ser, a religião fundiu-se à evolução, confundindo os homens e fazendo-o acreditar que “crer é preciso”. 
Fim

Nenhum comentário:

Postar um comentário